domingo, 18 de julho de 2010

Anaecypris hispanica, Saramugo

Taxonomia
Actinopterygii, Cypriniformes, Cyprinidae.

Tipo de ocorrência
Residente. Endémica da Península Ibérica (Bacia do Guadiana).

Classificação
CRITICAMENTE EM PERIGO . CR (A2bce+3bce+4bce)
Fundamentação: Admite-se que a redução da espécie nos últimos dez anos tenha atingido 80% do número de indivíduos maduros e prevê-se que possa continuar a verificar-se nos próximos dez anos ou em qualquer período com a mesma amplitude que abarque o passado e o futuro. As causas da redução embora geralmente compreendidas, não são reversíveis nem cessaram. A avaliação da redução é baseada em dados de abundância, no declínio da qualidade do habitat e também na expansão de espécies não-indígenas.

Distribuição
Endemismo restrito à região média e inferior da bacia hidrográfica do Guadiana, desde o rio Estena (Espanha) até ao Rio Odeleite (Portugal) (Collares-Pereira & Cowx 2001).
Em Portugal tem uma distribuição bastante localizada e severamente fragmentada, ocorrendo nas sub-bacias hidrográficas do Xévora, Caia, Álamo, Degebe, Ardila, Carreiras, Chança, Vascão, Foupana e Odeleite (Collares-Pereira et al. 2000a, 2002a).
A espécie tem uma extensão de ocorrência e área de ocupação bastante reduzidas (menores que 5.000 km2 e 500 km2, respectivamente) e tem-se registado um declínio continuado da área de ocupação, em particular na sub-bacia hidrográfica da ribeira do Lucefécit, onde a espécie foi referenciada por Collares-Pereira (1983a) e não voltou a ser capturada.

População
Calcula-se que o número de indivíduos maduros seja superior a 10.000. Esta espécie é mais frequente e abundante nas sub-bacias do sul da bacia hidrográfica do Guadiana em território português (Collares-Pereira et al. 1999b). Em Portugal a população encontra-se em declínio continuado pelo menos desde a década de 1980 (Collares-Pereira 1990) e os dados recolhidos entre 1998 e 2001 reforçam esta tendência (Collares-Pereira et al. 2000a, Tiago et al. 2001, Collares-Pereira et al. 2002a). Estudos de genética demonstraram haver isolamento demográfico entre os núcleos populacionais que ocorrem em Portugal (Alves et al. 2001a, Coelho et al. 2002, Salgueiro et al. 2003).

Habitat

Ocorre em pequenos cursos de água de carácter intermitente, com reduzida profundidade, oxigenados, com alguma corrente, vegetação aquática e fundo pedregoso, característicos dos cursos de água mediterrânicos (Collares-Pereira et al. 2000a, Ribeiro et al. 2000). Não há registos em albufeiras (Ferreira & Godinho 2002) e também nunca foi capturado no rio Guadiana, sendo mais frequente nas zonas de montante dos seus afluentes (Collares-Pereira et al. 2002a, Filipe et al. 2002).

Factores de Ameaça
Esta espécie tem regredido devido à degradação do habitat, provocada sobretudo pela implementação de infra-estruturas hidráulicas na região (como é o caso das do Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva), alteração do regime natural de caudais, captação de água, extracção de inertes, degradação da qualidade da água e também a introdução de espécies não indígenas, a qual poderá ter efeitos a nível da competição, predação ou como via de disseminação de agentes patogénicos. Apesar de estar adaptada às severas condições dos rios intermitentes, a sua vulnerabilidade aos impactos humanos durante a época seca, quando se refugia em pegos, é muito elevada (Collares-Pereira et al. 1999b, 2000a,c, 2002a) o que pode acentuar a sua fragmentação (Ribeiro et al. 2000).

Medidas de Conservação
Esta espécie está abrangida pela legislação nacional e internacional de conservação. Vários locais da bacia hidrográfica do Guadiana foram designados para a lista nacional de sítios ao abrigo da Directiva Habitats devido à sua presença, entre outros valores, mas carecem ainda de medidas de ordenamento e gestão dirigidas à espécie. O saramugo foi estudado no projecto LIFE-Natureza (Collares-Pereira et al. 2000a) e abrangido nos estudos sobre a comunidade piscícola relativos às medidas de Minimização e Monitorização para o Património Natural da Barragem do Alqueva (Tiago et al. 2001, Collares-Pereira et al. 2002a). Algumas acções de manutenção e conservação do habitat (nomeadamente a melhoria da qualidade da água e algum controlo das extracções de inertes) têm sido efectuadas mas necessitam ser reforçadas.
É necessária a recuperação das zonas mais degradadas e o controlo das espécies não indígenas, medidas previstas no Plano de Bacia Hidrográfica do Guadiana (INAG 1998), no Plano de Gestão do Saramugo (Collares-Pereira et al. 2000b) e no estudo de Minimização e Monitorização para o Património Natural da Barragem do Alqueva (Tiago et al. 2001, Collares-Pereira et al. 2002a). As medidas preconizadas na Directiva-Quadro da Água deverão atingir a melhoria permanente da qualidade dos habitats aquáticos. Devem ser minimizados os impactos de infra-estruturas hidráulicas implantadas ou a implantar, de modo a evitar uma maior fragmentação das populações e a manter os caudais mínimos, especialmente durante a época seca. Em particular, devem ser controladas as captações de água durante esta época, nomeadamente nos pegos. Outras medidas necessárias são o controlo da extracção de inertes, a gestão sustentada da pesca e a melhoria da sua fiscalização e ainda a sensibilização do público para a conservação dos ecossistemas aquáticos. É necessário aumentar os conhecimentos sobre a biologia e ecologia desta espécie, monitorizar os seus efectivos populacionais e a eficiência das medidas de conservação a implementar.

Outra bibliografia consultada
Collares-Pereira et al. (1997, 1998); Ribeiro (1998); Collares-Pereira et al. (2002b).


in Livro Vermelho dos Vertebrados

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