sábado, 25 de setembro de 2010

O airsoft e a legislação em Portugal

Jogo dos HOT em 2004
Apesar de o airsoft ser praticado à mais de uma dezena de anos em Portugal, o jogadores de airsoft passaram por momentos conturbados durante muitos anos.
A legislação portuguesa não contemplava a posse de réplicas de airsoft, o facto de as réplicas serem réplicas de armas de guerra reais, aliado ao desconhecimento da modalidade por parte dos agentes de autoridade, levou por mais de uma vez à apreensão de réplicas obrigando a que os jogos se realizassem por convite expresso dos jogadores, em locais isolados, mantendo os jogadores nas suas deslocações um 'low profile' que não denunciasse a sua qualidade de jogadores de airsoft. 
Países como o Reino Unido, com problemas de terrorismo interno e inclusive alvo de terrorismo internacional, regularam-no muito antes de Portugal.

Aliás em virtude do ataque da Al Qaeda de que foi alvo, o Reino Unido tomou medidas que levaram à aplicação de regras muito mais rígidas no âmbito da posse de armas através da VCRA (Violent Crime Reducion Act).
 
Ora de acordo com a VCRA (Sec 38 (3) (b)), uma réplica é considerada irrealista se a sua maioria (i.e. +50%) for de uma cor brilhante. No entanto foi criada uma excepção no âmbito da prática do airsoft, os jogadores registados na base de dados da UKARA (United Kingdom Airsoft Retailers Association) podem praticar a modalidade com o que é classificado como RIF (Real Imitation Firearm), ou seja as suas réplicas de jogo são imitações das armas reais sem quaisquer tipos de pinturas. 
As réplicas de dois tons (um deles em cor brilhante) destinam‐se aos adultos não registados na base de dados da UKARA (por não serem praticantes da modalidade), ou aos praticantes menores de 18 anos com a autorização dos respectivos encarregados de educação. 
A Lei 5/2006 veio finalmente contemplar as réplicas de airsoft, mas mais uma vez, a legislação em vez de seguir os melhores exemplos europeus, toma uma posição restritiva que vem provocar grandes alterações à prática de airsoft.

Artigo 2.o
Definições legais
[...]
ad) «Arma de softair» o mecanismo portátil com a configuração de arma de fogo das classes A, B, B1, C e D, integral ou parcialmente pintado com cor fluorescente, amarela ou encarnada, por forma a não ser susceptível de confusão com as armas das mesmas classes, apto unicamente a disparar esfera plástica cuja energia à saída da boca do cano não seja superior a 1,3 J;

Artigo 3.o
Classificação das armas, munições e outros acessórios
[...]
9—São armas da classe G:
a) As armas veterinárias;
b) As armas de sinalização;
c) As armas lança-cabos;
d) As armas de ar comprimido desportivas;
e) As armas de softair.

Artigo 11.o
Armas da classe G
[...]
3—A aquisição de armas de softair é permitida, mediante declaração de compra e venda, a maiores de 18 anos unicamente para a prática desportiva e mediante prova de filiação numa federação desportiva da modalidade.
 
Ao não definir o valor exacto da pintura exigida para uma réplica de airsoft, levou a que as autoridades policiais exigissem arbitrariamente a sua pintura em 50%, valor irrealista e impraticável para a sua utilização em jogos, o que não era seguido pela maioria dos jogadores, que optaram por uma quantidade de pintura similar à exigida nos poucos países europeus que não criaram regime de excepção para os jogadores de airsoft e que correspondia a cerca de 5 a 7 cms numa réplica de arma longa. 
Ao definir um valor máximo de energia uniforme para todas as réplicas veio impedir o utilização de réplicas especificas em determinadas actividades no jogo. Até à então os valores definidos por convenção entre as equipas praticantes era de 350fps para as AEG's (réplicas automáticas) e de 500fps para as réplicas de sniper (réplicas de ferrolho para tiro de precisão). O valor energético definido por lei de 1,3J correspondia a 374fps com bb's de 0,20grs, a munição usualmente usada para medição de valores de energia por ser a mais utilizada em jogo. 
Esta medida implicou que os atiradores de precisão, vulgo snipers, estavam por lei obrigados a utilizar nas suas réplicas a mesma energia que os restantes jogadores e por conseguinte ficavam impossibilitados de jogar, porquanto a actividade do sniper consiste no tiro de precisão à distância e fora do alcance de tiro dos restantes jogadores, porque não pode competir com uma réplica que efectua um disparo de cada vez contra uma que dispara em rajada... 
Por outro lado o Instituto do Desporto de Portugal não considera o airsoft um desporto e como tal não reconhece a existência de uma federação desportiva da modalidade.
Em 2009, resolve o Governo rever a Lei 5/2006, mas em vez sanar as questões que vieram atingir a prática da modalidade em Portugal, veio agravar algumas delas!

Se é verdade que a Lei 17/2009, felizmente suavizou muitas das rígidas regras constantes da proposta de lei do Governo, não deixou de ter reflexos graves para a prática da modalidade:

Artigo 2.º
Definições legais
[...]
ag) «Reprodução de arma de fogo para práticas recreativas» o mecanismo portátil com a configuração de arma de fogo das classes A, B, B1, C e D, pintado com cor fluorescente, amarela ou encarnada, indelével, claramente visível quando empunhado, em 5 cm a contar da boca do cano e na totalidade do punho, caso se trate de arma curta, ou em 10 cm a contar da boca do cano e na totalidade da coronha, caso se trate de arma longa, por forma a não ser susceptível de confusão com as armas das mesmas classes, apto unicamente a disparar esfera não metálica cuja energia à saída da boca do cano não seja superior a 1,3 J para calibres inferiores ou iguais a 6 mm e munições compactas ou a 13 J para outros calibres e munições compostas por substâncias gelatinosas;

Artigo 3.º
Classificação das armas, munições e outros acessórios
[...]
9 — São armas e munições da classe G:
a) As armas veterinárias;
b) As armas de sinalização;
c) As armas lança -cabos;
d) As armas de ar comprimido desportivas e de aquisição livre;
e) As reproduções de armas de fogo para práticas recreativas;
f) As armas de starter;
g) As armas de alarme ou salva que não estejam incluídas na alínea n) do n.º 2 do presente artigo;
h) As munições para armas de alarme ou salva e para armas de starter.

Artigo 11.º
Armas e munições da classe G
[...]
3 — A aquisição de reproduções de armas de fogo para práticas recreativas é permitida aos maiores de 18 anos, mediante declaração aquisitiva e prova da inscrição numa associação de promoção desportiva reconhecida pelo Instituto do Desporto de Portugal, I. P., e registada junto da PSP.
4 — Sem prejuízo do disposto no número anterior, aos menores de 18 anos e maiores de 16 anos é permitida a aquisição de reproduções de armas de fogo para práticas recreativas desde que autorizados para o efeito por quem exerça a responsabilidade parental.
 
Se com a ponta da réplica pintada de vermelho ou amarelo fluorescente, já era possível detectar um jogador adversário escondido entre a vegetação, com 10 cms do cano pintados e a totalidade da coronha, a detecção tornou-se bastante mais fácil... 
 
Mas os nossos políticos não se deram por satisfeitos, há poucos dias atrás o CDS/PP apresentou uma nova proposta de alteração à Lei 5/2006, e infelizmente mais uma vez o airsoft é profundamente atingido por uma das alterações propostas:

Artigo 2.º
[…]
ag) «Reprodução de arma de fogo para práticas recreativas» o mecanismo portátil com a configuração de arma de fogo das classes A, B, B1, C e D, pintado com cor fluorescente, amarela ou encarnada, indelével, claramente visível quando empunhado, em 5 cm a contar da boca do cano e da totalidade do punho, caso se trate de arma curta, ou em 10 cm a contar da boca do cano e na totalidade da arma, caso se trate de arma longa, por forma a não ser susceptível de confusão com as armas das mesmas classes, apto unicamente a disparar esfera não metálica cuja energia a saída da boca do cano não seja superior a 1,3 J, ficando excluídos desta definição os marcadores de paintball;
ah) «Marcador de paintball» o mecanismo portátil propulsionado a a ar comprimido, que externamente poderá apresentar semelhanças com armas das classes A, B, B1, C e D, apto unicamente a disparar esfera não metálica constituída por tinta hidrossolúvel e biodegradável não poluente contida em invólucro de gelatina, cuja energia à saída da boca do cano não seja superior a 13 J;

Fiquei estupefacto!

"...em 10 cm a contar da boca do cano e na totalidade da arma..."! Para já a frase não faz sentido, ou será 10 cm a contar da boca do cano ou então na totalidade da arma! A minha esperança é que na realidade se tenha tratado de um lapso na transcrição da Lei 17/2009 que diz "...em 10 cm a contar da boca do cano e na totalidade da coronha..."

Mas porque razão um marcador de paintball "...que externamente poderá apresentar semelhanças com armas das classes A, B, B1, C e D..." estão excluídos da obrigatoriedade de pintura, mas uma réplica de airsoft "...com a configuração de arma de fogo das classes A, B, B1, C e D..." estão sujeitas a essa obrigatoriedade?

O que torna esta réplica mais perigosa o assustadora do que este marcador?





Atenção, não tenho nada contra a exclusão dos marcadores semelhantes a armas das classes A, B, B1, C e D da pintura, pelo contrário, acho que não faz qualquer sentido é que quer as réplicas de airsoft quer o marcadores tenham de ser pintados!

Alegam as autoridades policiais que a pintura tem por objectivo evitar a confusão com armas reais, será que isso vai significar que se alguém apontar uma arma pintada de amarelo ou vermelho fluorescente a um agente de autoridade ele não dará qualquer valor a esse facto porque sabe que se trata de um brinquedo? Espero bem que não! Teríamos os criminosos a pintar as suas armas reais para agirem impunemente!

A revista americana FPS de Junho de 2002 publicava um artigo sobre a norma que impunha que uma réplica de airsoft para entrar nos EUA teria de ter a extremidade pintada de cor laranja em pelo menos seis milímetros a partir do cano. Diziam: «Eu assisti, em primeira mão, nas feiras de armas, a oficiais de polícia inspeccionando réplicas de airsoft e dizendo, “Marca laranja ou não, se alguém vier para mim com uma destas, vai levar um tiro.”».

Porque razão para legislar em Portugal é necessário complicar tudo e lesar o cidadão cumpridor? Porventura algum marginal que adquira uma reprodução de arma de fogo para práticas recreativas, para fins ilícitos, se irá preocupar em efectuar a sua pintura? Lesados serão todos aqueles que cumprem a lei e que cada vez tem mais dificuldade em jogar... Ainda este mês estiveram jogadores portugueses num jogo internacional na República Checa, e como se vê lá pode-se jogar sem as nossas restrições.
 
Era só propor a alteração da lei nestes termos e ficariam salvaguardados os interesses das duas modalidades, o airsoft e o paintball:

Artigo 2.º
Definições legais
[...]
ag) «Reprodução de arma de fogo para práticas recreativas» o mecanismo portátil com a configuração de arma de fogo das classes A, B, B1, C e D, apto unicamente a disparar esfera não metálica cuja energia à saída da boca do cano não seja superior a 1,3 J, para reproduções de arma de fogo dotadas da capacidade de disparo semiautomático e 2,3 J para reproduções de arma de fogo longa com sistema de ferrolho, para calibres inferiores ou iguais a 6 mm e munições compactas ou a 13 J para outros calibres e munições compostas por substâncias gelatinosas;

Não perdemos a esperança de que alguém no nosso Parlamento ouça os ecos das vozes dos praticantes e por isso já corre online uma petição. Colabore connosco, assine-a.

 


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