terça-feira, 14 de setembro de 2010

Caretta caretta, Tartaruga-comum

Taxonomia
Reptilia, Testudines, Cheloniidae.

Tipo de ocorrência
Açores e Madeira: Visitante.

Classificação
Açores e Madeira: EM PERIGO . EN (A1abd) (adopção da categoria IUCN (1994))
Fundamentação: A espécie teve uma redução do tamanho da população de pelo menos 50% nas últimas 3 gerações.

Distribuição
A tartaruga-comum é uma espécie de distribuição ampla, em águas costeiras tropicais e subtropicais, em todos os oceanos.

Em Portugal ocorre em números apreciáveis somente nas subáreas da Zona Económica Exclusiva (ZEE) dos Açores e da Madeira, fazendo parte de uma população mais ampla que abrange grande parte do Atlântico Norte Central e Ocidental.

As águas continentais servem de passagem ocasional para indivíduos de origem principalmente norte-atlântica, mediterrânica e possivelmente marroquina e cabo verdiana. Como tal, esta espécie deverá ser considerada, segundo as definições da IUCN, uma espécie visitante nas águas das subáreas das ZEE insulares e ocasional na subárea do Continente.

População
As tartarugas-comuns presentes em águas insulares pertencem às populações nascidas nas costas ocidentais do Atlântico Norte: nas praias do Sudeste dos Estados Unidos da América e da adjacente península de Yucatán, México (Bolten et al. 1998). Sendo as tartarugas filopátricas as suas praias de nidificação podem ser subdivididas em subpopulações geneticamente distintas. Foram encontradas em águas insulares tartarugas com origem nas subpopulações da Florida NE-NC (Florida NE . Carolina N), da Florida SE-SW e do Yucatán / México (Turtle Expert Working Group 1998, 2000, National Marine Fisheries Service Southeast Fisheries Science Center 2001).

Estes animais passam os primeiros 6-12 anos da sua vida, fase vital denominada de estado oceânico ou pelágico, em águas portuguesas (Bjorndal et al. 2000, Bjorndal et al. 2003a). As populações insulares são, portanto, compostas exclusivamente por indivíduos juvenis não maduros.

Não é possível neste momento efectuar uma estimativa clara do número de indivíduos que frequentam de facto as águas insulares, tendo em conta a dimensão da área a amostrar e a probabilidade de avistamento depender de factores comportamentais, oceanográficos e meteorológicos (Dellinger 2000).

As tartarugas foram historicamente exploradas pelo homem, supondo-se que os seus níveis populacionais estejam muito reduzidos em relação a níveis de pré-exploração. Não existem contudo dados sobre estes últimos para esta espécie. Actualmente as subpopulações da tartaruga-comum no Atlântico Oeste estão lentamente a recuperar. Foi feita uma metaanálise dos dados de nidificação para as subpopulações e praias dos EUA, indicando uma tendência de aumento para a maioria (Myers et al. 2001). A subpopulação principal, na Florida do Sul, está a aumentar a uma taxa anual de cerca de 4% (Turtle Expert Working Group 1998, 2000, National Marine Fisheries Service Southeast Fisheries Science Center 2001).

Habitat
Os indivíduos adultos apresentam hábitos costeiros e os juvenis e subadultos ocorrem exclusivamente no alto mar.

Nas águas portuguesas ocorrem predominantemente juvenis, que exploram as frentes oceânicas, onde encontram o alimento. Estas frentes não são fixas em termos geográficos. Normalmente as tartarugas não são observados junto da orla costeira, mesmo nas regiões insulares (Dellinger et al. 1997, Dellinger 2000).

Factores de ameaça
A nível mundial, a redução dos efectivos populacionais desta espécie é devida essencialmente às ameaças que actuam sobre as praias de nidificação. Nestas ameaças, causadas pelo homem, incluem-se as capturas de ovos e fêmeas nidificantes e o uso intensivo de praias para fins de lazer. O aumento da urbanização e das infraestruturas turísticas nas praias contribui para que as causas da redução não tenham cessado. No entanto, a adopção de medidas de protecção rígidas em locais ainda não sujeitos a um tão elevado nível de pressão humana tem permitido uma ligeira recuperação da espécie a nível mundial.

Nas ZEE.s portuguesas o principal factor de ameaça à espécie é a captura acidental por artes de pesca (Bolten et al. 1994, Dellinger 2000, Dellinger & Encarnação 2000, Ferreira et al. 2001), especialmente os palangres. Os lixos persistentes, tais como plásticos, o crude e os apetrechos de pesca abandonados, incluindo linhas e redes, têm um impacto não quantificado mas provavelmente também significativo, nomeadamente através de enredamento e ingestão. O impacto de interacções com o tráfego marítimo e outras actividades humanas no mar, embora não tenha também sido quantificado, poderá igualmente afectar as tartarugas de forma negativa, em virtude de estas se encontrarem essencialmente nos primeiros metros da coluna de água. No entanto, em comparação com as fases vitais costeiras, as tartarugas em alto mar parecem ter uma taxa de sobrevivência superior (Bjorndal et al. 2003b).

Até ao ano de 2003 as ZEE.s dos Açores e da Madeira eram exploradas quase exclusivamente por navios de pesca registados nos portos destas ilhas. O regulamento CE nº1954/03 reduziu a área restrita à pesca até às 100 milhas náuticas (mn) a contar da linha de base dos Açores e da Madeira. Assim a área entre as 100 mn e as 200 mn das ZEE.s da Madeira e Açores encontra-se aberta à pesca por outros países comunitários, sendo o esforço de pesca fixado anualmente. Esta situação, ainda não avaliada, poderá levar a um aumento das capturas acidentais de tartarugas marinhas, e a uma maior dificuldade de mensurar o seu impacto.

Medidas de conservação
Somente o conhecimento claro do impacto das diferentes artes de pesca sobre as tartarugas e a sua evolução ao longo do tempo permitirá desenhar medidas eficazes de conservação.

Neste sentido deverá ser dada prioridade a programas de monitorização das capturas acidentais de tartarugas em artes de pesca, comercial e desportiva, que incluam uma obrigatoriedade de declaração dos animais capturados e implementação de programas de observação independente a bordo dos navios pesqueiros. Está em curso nos Açores, desde o ano de 2000, uma experiência visando a diminuição das capturas acidentais de tartarugas (Bolten et al. 2000). Na pesca de palangre dirigida ao espadarte foram testados anzóis com diferentes tamanhos e formas e em diferentes combinações. Os resultados mostram que a modificação da arte de pesca tem excelentes potenciais para reduzir a mortalidade das tartarugas (Bolten et al. in press). O impacto da captura com anzol sobre o comportamento migratório subsequente das tartarugas sobreviventes continua a ser estudado nos Açores (Riewald et al. 2001).

Na Madeira está a ser analisado o comportamento de mergulho das tartarugas e quantificadas as profundidades mais sensíveis para a interacção com os palangres de pesca (Dellinger 2004). Este estudo tem vindo a mostrar que a redução do tempo de permanência dos anzóis nos primeiros 20m da coluna de água irá provavelmente reduzir as capturas acidentais de tartarugas, sem afectar as capturas da espécie-alvo. No âmbito desses projectos estão também a ser realizadas campanhas de educação e sensibilização ambiental.

O número de tartarugas vítimas de poluição poderia ser diminuído com uma maior sensibilização, fiscalização e, se necessário, aplicação de medidas coercivas para infractores das leis sobre poluição no mar e em especial poluição com lixo persistente. Como contrapartida deveriam existir mais infra-estruturas de recolha de resíduos nos portos nacionais.

Sendo Caretta caretta uma espécie de migração ampla, seria apropriado Portugal assinar o .Memorando de Entendimento relativo à conservação das tartarugas marinhas ao longo da costa atlântica de África. no âmbito da Convenção de Bona. Este promove a protecção integrada das populações ao longo da costa africana, incluindo as da Madeira que migram regularmente até às costas africanas de Marrocos e da Mauritânia (Dellinger 2000, Dellinger & Freitas 2000).

Deve-se ainda trabalhar activamente para obter um acordo entre Marrocos, Mauritânia, Espanha e Portugal no sentido de proteger a área de distribuição da fase oceânica desta espécie. A actividade pesqueira (industrial e artesanal) em todas estas zonas deveria limitar e melhorar (de forma a reduzir os impactes) as artes com efeitos negativos sobre a espécie.

Para além disto, devem-se desenvolver estudos no sentido de identificar potenciais áreas oceânicas importantes para a conservação das tartarugas marinhas durante a fase pelágica, com especial destaque para as zonas de bancos submarinos.

Outra bibliografia consultada
Brongersma (1972); Ehrhart (1982); Barbadillo (1987); Crouse et al. (1987); Groombridge (1990); Márquez (1990); National Research Council (1990); Bolten et al. (1993); Camiñas & de la Serna (1995); Meylan et al. (1995); Camiñas (1996); Encarnação (1998); Granadeiro & Teixeira (1999); Márquez (2000); Bjorndal et al. (2001); Fretey (2001); Bolten (2003); Dellinger et al. (2003).

in Livro Vermelho dos Vertebrados

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