sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Flash Desligado

Ícone universalmente reconhecido,
para o flash desligado.
Em muitas câmaras, quando pressiona o botão do obturador até meio, acende-se um indicador que o avisa que o flash vai disparar quando tirar a fotografia. É necessário estar atento a este aviso, para não ser surpreendido pelo disparo do flash. A luz do flash pode chamar atenções indesejadas, especialmente em galerias de arte ou museus, onde o uso do flash é normalmente proibido. Para prevenir que o flash dispare, é possível desligá-lo. Mas também o pode desligar por razões criativas. Pode haver situações em que a luz é fraca, mas em que pretende captar as cores únicas que ela produz. Por exemplo, pode pretender captar o brilho romântico de um espaço interior, ou a escuridão taciturna de uma fotografia à noite.

luz disponível pode proporcionar cores
muito agradáveis a uma fotografia.
Noutros modos, o flash expõe correctamente o motivo em primeiro plano, mas mantém o plano de fundo demasiado escuro. O uso da luz disponível pode proporcionar imagens muito melhores.

A maneira de desligar o flash varia de câmara para câmara. Nos flashes externos, existe geralmente o botão de ligar/desligar, ou pode-se seleccionar o modo de flash desligado, por vezes chamado cancelamento do flash (flash cancel) ou flash proibido (flash prohibited) que desliga tanto os flashes externos, como os integrados. Em algumas câmaras, basta fechar o flash.

Podem-se obter cores muito
mais naturais em retratos
fotografados em interiores,
com o flash desligado.
Quando fotografa em condições de luz fraca, sem usar o flash, há algumas questões a ter em atenção, pata obter melhores resultados e evitar que a fotografia fique tremida devido ao movimento da câmara.
  • Aumentar a sensibilidade (ISO) da câmara, apesar de isto adicionar ruído à imagem.
  • Usar um tripé para suportar a câmara, colocá-la numa prateleira ou numa vedação, ou encostá-la a uma árvore ou outro suporte sólido.
  • Colocar a câmara numa superfície estável e usar o temporizador, controlo remoto, ou cabo disparador para desencadear a obturação, de forma a não mover a câmara, como acontece quando pressiona o botão do obturador com o dedo.

Nesta fotografia, foi usado o zoom da objectiva durante uma exposição longa.
A câmara estava apoiada numa grade.



quinta-feira, 21 de setembro de 2017

T-Buffer

Além de passar a suportar grandes texturas e 32 bits de cor, corrigindo as principais deficiências dos chipsets Voodoo anteriores, o VSA-100 traz um recurso inédito chamado T-Buffer, um passo adiante em termos de qualidade de imagem.

Veja que uma das etapas mais cruciais na geração de uma imagem 3D de boa qualidade é o processo de renderização, onde a imagem tridimensional gerada pelo trabalho conjunto do processador e do chipset de vídeo é transformada na imagem 2D que será exibida no monitor. O processo de renderização se baseia num sistema de amostras, como se você tirasse instantâneos de uma imagem em movimento. Quanto mais fotos forem tiradas no mesmo espaço de tempo, mas detalhes do movimento serão capturados, e teremos uma sequência mais detalhada. Estes “instantâneos” são justamente os quadros da animação. Quanto mais quadros por segundo tivermos, ou seja, quanto maior for o FPS, mais perfeita será a movimentação da imagem.

No processo tradicional, à medida em que a placa de vídeo termina de produzir a imagem, ela as envia para uma memória especial chamada Frame Buffer. A imagem armazenada no Buffer é então renderizada e enviada para o monitor. Assim que é produzida uma nova imagem, a antiga é apagada do Buffer para dar lugar à nova. Este estão é renderizada e enviada para o monitor.

Temos então uma espécie de fila. Uma imagem é produzida, renderizada e enviada para o monitor, em seguida outra imagem é produzida renderizada e enviada para o monitor, etc.

Veja que cada imagem exibida no monitor é o resultado da renderização de apenas uma imagem 3D produzida pela placa de vídeo.


Utilizando o T-Buffer do VSA-100, este processo é feito de uma maneira ligeiramente diferente. As imagens 3D continuam sendo produzidas pelo chipset de vídeo, mas ao invés do Buffer armazenar apenas uma imagem de cada vez, é capaz de armazenar ao mesmo tempo varias imagens sequenciais. É justamente por isso que no VSA-100 ele é chamado de T-Buffer.

A ideia principal pode ser resumida a único termo: “supersampling”, ou “superamostragem”. Com vários quadros à sua disposição ao mesmo tempo, o processador que faz a renderização da imagem pode criar imagens de melhor qualidade. Basicamente, o T-Buffer possibilita o uso de 5 recursos, chamados Motion Blur, Spatial Anti-Aliasing, Focal Anti-Aliasing, Soft Shadows e Reflectance Blur:



in Manual de Hardware Completo
de Carlos E Marimoto



segunda-feira, 18 de setembro de 2017

WE Makarov PMM GBB - Black


Marca: WE
Código do Produto: GUNT0581
Hop-Up: Ajustável
Peso: 740 grs
Comprimento: 275 mm
Capacidade: 16 bb's
Potência: 380 fps
Fonte de energia: Green Gas / Top Gas
Blowback: Sim
Modo de tiro: Semi-Automático

Um verdadeiro clássico do desenho Russo, a Makarov era a arma de apoio pessoal standard da União Soviética de 1951 a 1991. A pistola Makarov, fundamentalmente é uma grande Walther PP, resultado de um desenho no concurso para substituir a Tokarev TT-33. Esta pistola de airsoft não corresponde completamente à sua versão real em metal já que parece moderna.

Existem duas razões para que ela pareça moderna. A primeira, o punho é mais ergonómico pois parece seguir um estilo mais competitivo de tiro que se torna bastante confortável em qualquer mão, significa que é ambidextra. Mais do que isso, mais nenhuma característica segue o modelo já que o ferrolho da culatra e o desarmador estão no lado esquerdo da Makarov. A segunda razão é que também vem com um simulador de silenciador e um cano interno mais longo.

Podemos pensar porque o separaram mas isto é uma coisa boa porque alguém pode querer adicionar o silenciador sem aumentar a potência. Tudo depende do que o utilizador quiser. O cano interno mais longo vai aumentar os fps de 280 para 370 o que é um massivo salto tonando-a mais adequado a confrontos ao ar livre. Se quiser reduzir a potência, é só remover a extensão do cano interno já que muitos campos de confronto interior podem não permitir nada que dispare acima dos 330 fps.

Assim o que temos aqui é uma réplica que foi preparada para jogos no interior e no exterior. É preciso ter cuidado com o puxar do gatilho pois as bb's disparadas vão começar a navegar para a esquerda e para a direita depois da marca dos 20 metros. O que não pode esquecer é que a WE Makarov é uma pistola, não uma espingarda.


in










sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Utilizar o Flash de Enchimento

Quando fotografa pessoas ou outros objectos com luz lateral, as áreas de sombra podem ser tão escuras, que não têm detalhe. Quando o motivo está em contraluz, ou contra um plano de fundo iluminado, pode ficar subexposto.

Para resolver estes problemas é usado o flash de enchimento. Quando este modo é usado, o flash é disparado mesmo quando existe luz ambiente suficiente para fotografar sem ele. O flash de enchimento também é uma boa maneira de obter um balanço de cor preciso em condições de luz pouco comuns. Algumas câmaras ajustadas para flash automático também disparam o flash para iluminar sombras, quando reconhecem que o motivo está em contraluz.

Sem o flash de enchimento (à esquerda), fundo iluminado causou a subexposição do modelo. Ao usar o flash de enchimento (à direita), o modelo fica correctamente exposto. Cortesia de Tim Connor.
Ícone universalmente reconhecido, para o flash de enchimento
Uma das razões para usar o flash em exteriores é iluminar os olhos do modelo, fazendo-os brilhar.

quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Voodoo 4 e Voodoo 5

Estas duas famílias de placas, são baseadas no mesmo chipset de vídeo, o VSA-100. Estes foram os produtos mais avançado da 3dfx, antes de fechar as portas.

Em primeiro lugar, a qualidade de imagem foi sensivelmente aprimorada em comparação com as placas Voodoo 3, com o suporte a 32 bits de cor e texturas de 2048x2048. Outra novidade é que o VSA-100 também suporta os algoritmos de compressão de texturas FXT1 e DXTC, suportados pelo DirectX. Este recurso permite compactar as texturas antes de grava-las na memória de vídeo, diminuindo o espaço ocupado, sem sacrificar de forma perceptível a qualidade das imagens. A compressão é executada via hardware, por um componente separado na placa, por isso não existe perda de performance quando o recurso é usado.

Outra novidade é a volta do SLI (aquele recurso de conectar duas Voodoo 2 para aumentar o desempenho) porém implementado de uma maneira ligeiramente diferente. Ao invés de conectar duas placas, temos de 2 a 4 chips interconectados na mesma placa; o desempenho é o mesmo que teríamos conectando placas separadas, mas o custo de produção é bem mais baixo e temos ocupado apenas um slot da placa mãe.

O VSA-100 é utilizado em 4 modelos de placas diferentes, chamadas de Voodoo 4 4550, Voodoo 5 5000, Voodoo 5 5500 e Voodoo 5 6000. Como fez com as placas baseadas no Voodoo 3, a 3dfx lançou várias placas baseadas no mesmo chipset, mas com níveis diferentes de desempenho, cada uma destinada a uma faixa de preço e a um tipo de consumidor.

A Voodoo 4 4500 é a placa mais simples. Temos apenas um processador VSA-100 e 32 MB de memória. Esta placa existe tanto em versão PCI quanto em versão AGP.

Voodoo 4 4500

A 3dfx resolveu chamar esta placa de “Voodoo 4” por ela possuir apenas um processador VSA-100. As placas a seguir são chamadas de “Voodoo 5” por usarem o recurso de SLI permitido pelo VSA-100 possuindo 2 ou 4 processadores trabalhando em paralelo.

A Voodoo 5 5000 é vendida apenas em versão PCI, e é o mais simples entre os modelos Voodoo 5.

Possui dois processadores VSA-100 em SLI e 32 MB de memória.

A Voodoo 5 5500 por sua vez possui os mesmos recursos da Voodoo 5000, porém, traz 64 MB de memória (contra 32 MB da 5000) e foi vendida apenas em versão AGP (enquanto a 5000 é vendida apenas em versão PCI). Com estas duas melhorias a performance da placa melhora perceptivelmente, principalmente em jogos com texturas muito pesadas.

Em termos de recursos, as duas placas são idênticas, possuem suporte a texturas grandes, 32 bits de cor e a todos os recursos do T-Buffer, o que muda mesmo é apenas o barramento utilizado, performance e preço.

A Voodoo 5 5500, utiliza um slot AGP normal, o problema é que devido ao uso de dois processadores, tanto a Voodoo 5 5000, quanto a 5500 são muito “gulosas” em termos de consumo eléctrico, consumindo por volta de 40 Watts, muito mais do que um slot AGP comum pode fornecer com estabilidade. Ambas as placas possuem um conector de 4 pinos, onde deve ser conectado um dos plugs de energia da fonte, exactamente como fazemos com o disco rígido e o CD-ROM. Isto significa que a placa retira a maior parte da energia que consome directamente da fonte e não do slot AGP.

Voodoo 5

A Voodoo 5 6000 seria topo de linha da 3dfx, mas infelizmente não chegou a ser lançada oficialmente. chegaram a ser produzidas algumas versões de demonstração, distribuídas a algumas revistas e sites especializados, mas foi só.

Apesar disso, a Voodoo 5 6000 é um projecto de placa que realmente impressiona pela “forca bruta”. Nesta placa temos nada menos do que 4 chips VSA-100 trabalhando em paralelo, auxiliados por generosos 128 MB de memória RAM, mais memória do que muitos computadores possuem actualmente. Esta placa é vendida apenas em versão AGP 2X, pois o barramento PCI seria um gargalo para esta placa, devido a todo seu poder de processamento.

O desempenho é cerca de 80% superior ao da Voodoo 5500. Uma última observação é que por possuir 4 processadores, esta placa consome bastante electricidade, quase 70 watts. Devido a isto, seria necessário liga-la directamente na tomada usando uma fonte especial, de 100 Watts, que acompanharia a placa. O fio da fonte passa por dentro do gabinete e é ligado na parte de trás da placa.

Outro problema é a ventilação dentro da caixa. Os quatro chips geram muito calor, na sua versão comercial a Voodoo 6000 viria com 4 coolers, um para cada processador. Os coolers mantém a placa de vídeo fria, mas espalham calor dentro da caixa, aumentando a temperatura de funcionamento dos outros periféricos.

in Manual de Hardware Completo
de Carlos E Marimoto



quarta-feira, 13 de setembro de 2017

O movimento do Sol

O sol nasce aproximadamente a Este e põe-se a Oeste, encontrando-se a Sul ao meio-dia solar. A hora legal (dos relógios) está adiantada em relação à hora solar: no Inverno está adiantada cerca de 36 minutos, enquanto que no verão a diferença passa para cerca de 1h36m.




segunda-feira, 4 de setembro de 2017

Mário Cabral: o anjo do guarda-sol aberto

A literatura portuguesa perdeu uma das suas vozes mais singulares. Alexandre Borges assina um retrato de Mário Cabral, um escritor obcecado com o tempo e que viveu fora dele.


Os dias não estão para quem passe ao lado da entronização no panteão mediático. Talvez as coisas já não fossem fáceis no tempo de Van Gogh, mas o anonimato não seria certamente entendido então como pouco menos do que pecado capital. Hoje, o destino parece ter-se reduzido a duas hipóteses: ser-se muito conhecido ou não se ser ninguém – e não dá sinal de vir em breve a abrandar o ritmo ou mudar de rumo. Se não vai à TV, se não aparece no YouTube, se não consta da primeira página do Google, se não está sequer – OMG! – no Facebook, não existe. Mário Cabral foi assim. Nasceu em Angra do Heroísmo em 1963 e morreu, na cidade-natal, este mês de Agosto. Não aparecia no YouTube, não tinha Facebook, raramente ia à televisão e, ainda por cima, vivia na periferia da periferia. O panteão mediático não sabe, mas silenciou-se uma das vozes mais originais e consistentes da nossa literatura contemporânea.
Começou cedo e, aos 15 anos, já saberia que seria escritor. Em adulto, queimou tudo quanto produzira na adolescência – o mesmo exercício depurador que recomendava a todo o aspirante ao ofício que lhe aparecesse em busca de conselho. Durante anos, a sua escrita densa e difícil, profundamente simbólica quando em poesia e filosófica uma vez na ficção, em qualquer caso requerendo sempre ao leitor constantes digressões a uma preferencialmente variada bagagem cultural, esbarrou na porta fechada das editoras. Em 1995, publicou por meios próprios um livro de crónicas, “História duma Terra Cristã”, e cinco anos depois o primeiro com chancela: “O Meu Livro de Receitas”, doze poemas, um por cada mês do ano, exemplo típico da obsessão que mantinha pelo tempo e que a Pedra Formosa finalmente arriscara imprimir.
Estava à beira dos 37 anos, cedo em qualquer profissão, tarde para o mundo das artes, menos dadas aos late bloomers do que à irrupção fulgurante dos jovens talentos que, depois, com os anos e no processo de refinamento, se tendem a domesticar. A desproporção entre a escassa obra publicada e o volume dos inéditos que mantinha impecavelmente encadernados e organizados nas estantes de casa era um luxo raro a que há muito se conformara. Escrevia, cada vez mais, o que queria escrever, já nada preocupado em agradar a quem, pelos vistos, nunca conseguiria seduzir.
Ironia das ironias, foi precisamente então que se abriram as comportas da edição. Logo no ano seguinte, a Campo das Letras publica “O Livro das Configurações”, romance que se deixa ler como um diálogo platónico, entre figuras familiares em busca de uma tese: a de que cada um de nós traz em si o universo inteiro. Em 2005, foi a vez de “O Acidente”, história que começa com a morte de uma mulher à saída de uma igreja e evolui para questionar a realidade, recontando múltiplas vezes o episódio através dos diferentes ângulos daqueles que a ele assistiram, distinguido com o Prémio John dos Passos para o melhor romance publicado em Portugal em 2005-2006.
Mas é no volume seguinte que melhor se avistam e equilibram as múltiplas faces do autor: o filósofo lúcido e rigoroso, o poeta minucioso e erudito, o fervoroso intelectual católico. “Via Sapientiæ: da Filosofia à Santidade”, foi primeiro a tese de Doutoramento em Filosofia apresentada à Universidade de Lisboa e depois a obra publicada pela Imprensa Nacional – Casa da Moeda, em 2008. Quinhentas páginas que hão-de afastar os incautos, mas um ensaio pouco menos do que obrigatório sobre a filosofia portuguesa – ou a sua inexistência – a partir de Teixeira de Pascoaes, Delfim Santos e Agostinho da Silva, e que constitui, na verdade, uma reflexão acessível ao leigo, onde o talento literário arredonda as arestas dos territórios de outro modo áridos do texto académico.
A partir de 2012, já na Companhia das Ilhas, publicou “Tratados”, 24 poemas para as horas do dia e da noite, e o derradeiro “O Mistério da Casa Indeterminada”, romance trágico lançado em 2016 que é também uma extraordinária elegia acerca da condição feminina. Fora isso, encontramo-lo disperso ao longo dos anos, em poemas ou contos, integrando colectâneas e antologias dedicadas à nova literatura portuguesa, incluindo edições no México, Estados Unidos da América e Lituânia.
E, no entanto, a entrada enciclopédica acerca da obra literária publicada é incompetente para falar do resto da vida. Para aqueles que o conheceram, Mário Cabral foi ainda e sobretudo o aluno brilhante de Filosofia, o professor que marcou mais de 20 anos de alunos – e provavelmente o único que tinha a educação e as boas maneiras entre os seus critérios objectivos de avaliação. Foi o pintor abundante que os amigos conheceram em privado, mas que o público ainda só teve oportunidade de ver numas poucas exposições nos Açores ou nas capas de alguns dos livros. Foi o cultor dos jardins a que dedicou muitas das horas da sua vida e que poucos adivinharão ao passar diante da “Casa das Tramóias”, a morada da família, tão conhecida dos taxistas da Ilha Terceira que a Mário bastava entrar no carro e dizer: “É para minha casa.”
Poderia ter ficado a dar aulas na Faculdade de Letras de Lisboa logo no final dos anos 80, mas decidiu regressar a casa para apoiar a mãe após o falecimento do pai. Como um Kant das ilhas, não gostava de viajar e foi já nos últimos anos de vida que saiu pela primeira vez do país, a propósito de um festival literário no Brasil. Disciplinado, metódico, extravagante e estóico, ao mesmo tempo excêntrico e conservador, congregava características que talvez não se esperasse ver conviver, tão pacificamente, na mesma pessoa. Estava tão à vontade no ambiente de um mosteiro como no da mais cosmopolita pista de dança. Terá celebremente pedido um copo de leite na primeira ida ao Frágil, a fim de testar se o estabelecimento seria mesmo tão inclusivo quanto lho garantiam os amigos (teste que, diga-se de passagem, a mítica casa terá passado com distinção). Seria o mesmo a passear na freguesia piscatória de São Mateus da Calheta, onde sempre viveu com excepção dos anos da Universidade, na Praça de São Pedro ou em Times Square, se acaso alguma vez o tivessem convencido a abandonar por uns dias os seus amados cães a troco de ver in loco tão exóticas paragens.
Escreveu muito, toda a vida, e reescreveu, no processo nunca acabado de quem sabe ser aquele o seu destino. Toda a sua obra é atravessada pela crítica à decadência do Ocidente, ao relativismo moral, à indistinção entre as condições masculina e feminina, à perda da transcendência, à falta de vontade do indivíduo na determinação da realidade, ao volume excessivamente alto do som da publicidade que não nos deixa escutar o tédio. Debruçou-se, uma e outra e outra vez, sobre “o século que Deus não quis”, o XX, mas alimentava porventura infundadas esperanças quanto ao XXI. Permitiu-se sempre, em poesia ou prosa, a recorrente aparição de miraculosos anjos redentores. Nos últimos três anos, os do cancro, encontrou um novo tema: o corpo, e acentuou o tom abertamente comprometido com o Catolicismo, em abundantes textos publicados na imprensa regional açoriana. Viveu o suficiente para descobrir, como escreveu no último livro, que as araucárias davam flor. As cerimónias fúnebres tiveram lugar na igreja de São Mateus, a poucos metros de casa, como se toda a sua vida tivesse sido apenas o movimento de passar de um lado para o outro daquela estrada, mas, pelo meio, tivesse conhecido e contribuído, como poucos, para divulgar uma cultura universal.
Não sabemos ao certo o volume da obra que Mário Cabral deixa inédita ou sequer se terá conseguido concluir a obra de uma vida, a “Casa das Tramóias”, que recebeu o nome da casa física e que deveria viajar entre décadas de memórias e ficção. Só a família saberá o destino a dar a esses textos, bem como às dezenas e dezenas (centenas?) de quadros que só as visitas conheciam. A Pedra Formosa e a Campo das Letras já fecharam, mas ainda está acessível a obra publicada pela Imprensa Nacional – Casa da Moeda e pela Companhia das Ilhas. Nestes anos de hits e likes, hypes e views, cabe àqueles que tiveram o prazer e o privilégio de conhecer Mário Cabral a missão de fazer chegar ao maior número possível de pessoas a sua obra singular.
Alexandre Borges é escritor e guionista. Assinou os documentários “A Arte no Tempo da Sida” e “O Capitão Desconhecido”. É autor do romance “Todas as Viúvas de Lisboa” (Quetzal).
in