terça-feira, 2 de setembro de 2014

Falco peregrinus, Falcão-peregrino

Taxonomia
Aves, Accipitriformes, Accipitridae.

Tipo de ocorrência
Residente.

Classificação
VULNERÁVEL -– VU* (D)
Fundamentação: Espécie com população muito reduzida (inferior a 250 indivíduos maturos). Na adaptação à escala regional baixou-se a categoria, por se admitir que a população em Portugal poderá ser alvo de imigração significativa das regiões vizinhas e por não ser de esperar que essa imigração possa vir a diminuir.

Distribuição
Espécie cosmopolita no Mundo, só não existindo na Antártida. Ocorre em grande parte da Eurásia e nidifica na maioria dos países europeus (del Hoyo et al. 1994, Cramp 1998).

As populações do norte e do leste do Paleárctico Ocidental são fundamentalmente migradoras, enquanto que as do sul e do oeste são sedentárias, com as populações intermédias manifestando movimentos nómadas e dispersos, em particular as mais setentrionais (Cramp 1998).

Em Portugal, o falcão-peregrino tem uma distribuição bastante alargada, embora dispersa, que compreende grande parte da região Norte e a parte central da região Centro e ainda as arribas marinhas de Portimão/Alvor até Sines, da serra da Arrábida até ao Cabo Mondego, não ocorrendo ou sendo raro na restante área (Palma et al. 1999a, ICN dados não publicados).
 
População
Estima-se que a população actual esteja compreendida entre 75 e 110  casais. De acordo com Costa et al. (2003), as IBA’s nacionais (excluindo a da Costa Sudoeste, para a qual não são dados valores), totalizam 45-71 casais. No Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina foram identificados 21-23 casais/territórios (Alcazar et al. 2003). Dados recentes apontam ainda para um mínimo adicional de 12-18 territórios no litoral rochoso entre Lagos e Portimão, entre a serra da Arrábida e o Cabo Mondego e para mais alguns locais do país onde a espécie tem sido observada (ICN dados não publicados), assumindo a existência de pelo menos um território ou casal em cada quadrícula do atlas onde a espécie foi detectada (com nidificação confirmada, provável e possível), e excluindo as quadrículas de nidificação possível situadas em locais onde o habitat não é muito favorável. Este valor, comparado com as estimativas anteriores –35-59 casais em 1992 (Oliveira 1994a), 55-90 casais em 1997 (Palma et al. 1999a), corrobora a tendência de aumento do falcão-peregrino no nosso país já apontada por estes autores.

Em termos de estatuto de ameaça a nível da Europa, a espécie é considerada Não Ameaçada (BirdLife International 2004), tendo globalmente sofrido um aumento moderado nessa região. Em Espanha está classificada como Pouco Preocupante (LC) (Madroño et al. 2004), sendo referido um incremento populacional nalgumas regiões, sobretudo nas com densidades mais elevadas (Gainzarain et al. 2003),  o que leva a admitir um risco de extinção em Portugal mais reduzido, tendo-se descido uma categoria na adaptação regional.

Habitat
O habitat da espécie no nosso país, à semelhança do que aconteça noutras regiões (cf. Cramp 1998), é muito variado, mas em regra não ocupa áreas muito florestadas. Tipicamente está associado a tipos de paisagem com afloramentos rochosos de média a grande dimensão, em vales, serras e falésias marinhas, nidificando em plataformas sobre a rocha ou em antigos ninhos de outras aves construídos na rocha (Rufino 1989, Oliveira 1994a). Contudo, não é invulgar a nidificação em estruturas humanas e em árvores (Cramp 1998), havendo pelo menos uma tentativa de nidificação deste último tipo relatada para o nosso país, num ninho antigo de Buteo buteo (C Carrapato, com. pess.).

Caça em terrenos abertos, como culturas agrícolas, pastagens e matos.
 
Factores de Ameaça
À semelhança do que se passou no resto da Europa e do Mundo, a população nacional deve ter sofrido com a aplicação de pesticidas organoclorados persistentes, que terá levado a mortalidade directa e diminuição da produtividade (devido a interferências no metabolismo do cálcio e fragilidade da casca de ovos, bem como a malformações e morte dos embriões), e à diminuição da disponibilidade de presas. Contudo, desconhecem-se os efeitos nesta espécie dos pesticidas actualmente utilizados em Portugal. Em algumas regiões de Espanha comprovou-se uma baixa produtividade associada com um elevado uso de pesticidas nalgumas regiões (Gainzarain et al. 2003).

O abate a tiro, nomeadamente na caça aos pombos (Columba livia ou Columba livia x domestica) nas falésias marinhas e a diminuição desta sua presa potencial (Cancela da Fonseca 1994), poderão também ter contribuído para o declínio destes falcões no passado (Palma 1985, Oliveira 1994a). O roubo de ovos para coleccionismo e de crias para falcoaria já deverá ter tido mais importância, mas não deixa de merecer ainda assim preocupação. A mortalidade de falcões-peregrinos por electrocussão ou colisão em linhas de transporte de energia é uma realidade em Portugal (SPEA 2005).

Como outras aves ornitófagas, este falcão pode ser afectado por morbilidade e mortalidade causadas por doenças transmitidas pelos pombos (e.g. Candidíase, Tricomoníase, etc.).

A destruição e degradação de habitat, a abertura de acessos perto de fragas interiores e falésias marinhas, bem como o aumento da perturbação causada por várias actividades de turismo e lazer na proximidade dos ninhos, poderão levar ao abandono ou inviabilizar a recolonização de antigos de territórios.

Medidas de Conservação
A conservação desta espécie requer as seguintes acções:
  • reavivar e intensificar campanhas de sensibilização ambiental e de conservação da fauna, em particular das aves de rapina e outros predadores, dirigidas a caçadores, guardas e gestores de caça, afim de minimizar ou erradicar o abate ilegal e roubo de ninhos;
  • sensibilização dos agricultores para a adopção de boas práticas agrícolas, tanto em termos da racionalização no emprego de pesticidas, como da utilização
  • preferencial pela luta integrada e de produtos de mais rápida e inofensiva degradação;
  • reforço da fiscalização e uma aplicação mais efectiva da lei, relativamente às infracções e crimes contra a natureza e as aves de rapina em particular. Neste aspecto, não devem ser esquecidos a fiscalização e um controlo apertado sobre os animais comercializados e utilizados em falcoaria e cetraria, nomeadamente sobre as suas proveniências;
  • incentivo ao recurso mais generalizado das medidas agro-ambientais junto a proprietários e produtores agrícolas, de modo a ser mantida a agricultura e pecuária extensivas, pastagens e pousios;
  • condicionamento temporal do acesso e das actividades nas proximidades dos locais de ninhos e sensibilização do público em geral e dos praticantes de desportos radicais, em particular, para a conservação das espécies rupícolas ameaçadas e minimização da sua perturbação.
É importante realizar censos que permitam melhorar a estimativa populacional e monitorizar periodicamente os efectivos, bem como estudar temas como a selecção de habitat, ecologia trófica, níveis de toxicidade e biologia da reprodução. Deve ser feita monitorização da mortalidade ao longo das linhas de transporte de energia e correcção das mesmas, sempre que tal se justifique, em particular nas zonas mais importantes para a espécie e que regra geral são também importantes para outra avifauna.
 
Notas
De acordo com Tomé et al. (1998), são escassos os indivíduos avistados em Sagres, durante a passagem outonal, tal como o são em Gibraltar (Bernis 1980).

in Livro Vermelho dos Vertebrados


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