terça-feira, 1 de abril de 2014

Porphyrio porphyrio, Camão, Caimão

Taxonomia
Aves, Gruiformes, Rallidae.

Tipo de ocorrência
Residente.

Classificação
VULNERÁVEL -– VU* - (B2ab(iii); - D)
Fundamentação: Espécie com área de ocupação muito reduzida (inferior a 500 km2). A sua população apresenta fragmentação elevada e o seu habitat tem sofrido declínio continuado. A população é muito reduzida (inferior a 250 indivíduos maturos). Na adaptação à escala regional desceu uma categoria, por se admitir que a população em Portugal poderá ser alvo de imigração significativa das regiões vizinhas e por não ser previsível que essa imigração venha a diminuir.

Distribuição
Apresenta uma vasta área de distribuição a nível mundial, abrangendo a região mediterrânica, África, regiões meridionais da Ásia e grande parte das ilhas do subcontinente australiano (del Hoyo et al. 1996), tendo também recentemente sido introduzido nos Estados Unidos da América (Florida) (Pranty et al. 2000). 

Na Europa, onde apresenta uma distribuição muito fragmentada, ocorre em Portugal, Espanha, França e Itália (restrita à Sardenha) e Sudeste da Rússia.

Em Portugal, distribui-se ao longo da maior parte das zonas húmidas costeiras, desde o Algarve até à região do baixo Mondego (Pacheco & McGregor 2004). 

Está actualmente confirmado como reprodutor em 14 sítios (nove no Algarve, três na costa Alentejana, um no vale do Tejo e três no Baixo Mondego) e foi registada a presença de indivíduos em mais quatro locais. No Baixo Mondego a população é resultante de um projecto de re-introdução com indivíduos criados em cativeiro, que se iniciou em 1999 (Pacheco & McGregor  2004).

O camão tinha em finais do século XIX – princípios do século XX uma ampla distribuição em Portugal que, provavelmente, se estendia ao longo da maior parte das zonas húmidas costeiras, desde o Algarve até à região do baixo Mondego tendo a partir daí sofrido uma grande retracção da sua distribuição, tendo ficado confinada nos anos 80 a um único local no Algarve (Carlos de Bragança inéditos, Giraldes 1879, Seabra 1910, Tait 1924, Reis Júnior 1931, Themido 1933 e 1952, Coverley 1948, Cary 1973, Ferrand de Almeida et al. 1983, Sánchez-Lafuente et al. 1992; Pacheco & McGregor 2004). Esta regressão, que terá sido causada por perda e degradação de habitat (por drenagem e conversão das zonas húmidas em campos de cultivo e caça excessiva) ter-se-á invertido a partir dos anos 90. Actualmente, a espécie recolonizou uma parte considerável da sua antiga área de distribuição, quer por processos naturais quer devido a um projecto de re-introdução (Pacheco & McGregor 2004).

População
A população nidificante foi estimada em 49-67 casais em 2002 (Pacheco & McGregor 2004).

Após o grande declínio verificado entre finais do século XIX e meados do século XX, à semelhança do verificado no resto da Europa, a população portuguesa foi estimada em 10-15 casais entre 1978-84 (Rufino 1989) e 10-12 casais em 1984 (Teixeira 1985) confinados a um único local no Algarve (Ludo). Em 1989 a estimativa populacional foi de 5-10 casais, mas já em três zonas húmidas: Ludo, Caniçal de Vilamoura e Lagoa de S. Lourenço (Ramos 1994).

A recuperação da população nacional iniciou-se possivelmente no princípio dos anos 90, e mantém-se até aos dias de hoje, estando possivelmente dividida em 3 subpopulações na actualidade.

Em termos de estatuto de ameaça a nível da Europa, a espécie é considerada Localizada, uma vez que a população reprodutora europeia se encontra confinada a apenas 10 sítios; possui população relativamente pequena mas que aumentou substancialmente entre 1990 e 2000 (BirdLife International 2004). 

Em Espanha o camão é considerado Pouco Preocupante (LC) (Madroño et al. 2004), sendo referida uma tendência populacional positiva para esse país (Molina 2003).

Habitat
Habita exclusivamente zonas húmidas com águas paradas ou lentas, como pauis, lagoas, sapais e albufeiras, desde que a vegetação emergente e a profundidade da água sejam apropriadas. Os territórios têm que ter áreas com elevada densidade de vegetação, principalmente tabua Typha spp., bunho Scirpus spp., caniço Phragmites australis, junça Carex sp. e junco Juncus maritimus, onde as aves passam a maior parte do tempo.

Prefere águas calmas e lentas a águas correntes, embora possa ser encontrado nas áreas terminais e medianas de alguns rios.

Factores de Ameaça
As ameaças identificadas para a espécie em Portugal (Pacheco & McGregor 2004) foram: perda, degradação e fragmentação do habitat por causas humanas, principalmente ligadas à drenagem para conversão em terrenos de cultivo e construção de infra-estruturas ligadas ao turismo. Actualmente estas ameaças estão presentes em algumas zonas, quer da distribuição actual (afectando potencialmente cerca de 30% da população), quer da distribuição histórica do camão, sem estatuto de protecção. O seu efeito combinado pode levar ao isolamento de algumas subpopulações. Este factor deve contribuir consideravelmente para reduzir a capacidade dessas subpopulações para recuperarem, expandirem-se e colonizarem outras áreas com condições de habitat favoráveis, bem como trocar indivíduos entre si. A caça ilegal, a perturbação de origem antrópica e a poluição são também factores negativos a ter em conta. Pontualmente, registaram-se episódios de predação de crias e ovos por animais domésticos devido a alterações drásticas do habitat (drenagem abrupta de lagoas) induzidas pelo homem. Há ainda factores cujo real impacto é desconhecido, como é o caso do saturnismo.

Medidas de Conservação
Cerca de 65% da população reprodutora encontra-se no interior de ZPE’s e/ou áreas protegidas, e os restantes 35% distribuem-se por 4 áreas sem qualquer estatuto de protecção (Pacheco & McGregor 2004). É de realçar que 2 das 4 áreas mais importantes para a espécie a nível nacional se encontram nesta situação (lagoa dos Salgados e caniçal de Vilamoura) e que em ambas se prevêem intervenções que podem levar a perda e degradação significativa de habitat. É necessário portanto assegurar protecção legal aos sítios com habitat favorável para o camão. A espécie é contemplada pelo Plano de Acção Nacional para o Camão, sendo no entanto imprescindível a sua implementação no terreno. Particularmente é essencial a elaboração e implementação de planos de gestão para as ZPE’s em que ocorre e que ainda não os tem e rever os existentes que ainda não incluem acções necessárias à conservação do camão e do seu habitat. O camão beneficiou de um programa de re-introdução, com recurso a reprodução em cativeiro no baixo Mondego, que teve início em 1999.

Como medidas de conservação a implementar encontram-se a manutenção e recuperação do habitat, a interdição do uso do chumbo na actividade cinegética em zonas húmidas, a promoção de restrições à actividade cinegética nos locais onde a espécie se encontra presente, a manutenção do programa reprodução em cativeiro, a implementação de programas de investigação e de um esquema de censo e monitorização da população nacional. A sensibilização do público em geral de modo a aumentar o conhecimento sobre a espécie e a necessidade de se preservar o habitat de que depende foi também identificada como uma prioridade.

Notas
Aparentemente ocorre um influxo de indivíduos no Inverno, em algumas zona do sul do país.

in Livro Vermelho dos Vertebrados

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