Quatro anos decorreram entre a simbólica data de nascimento do escutismo, fixada nas suas crónicas fundacionais, e o primeiro ensaio de que há registo em território português. Robert Baden-Powell (1857-1941) foi, na sociedade britânica da década eduardiana, figura de indubitável destaque: a sua acção em serviço militar, sobretudo aquando do cerco de Mafeking (Outubro de 1899 – Maio de 1900), durante a Guerra dos Boers, valeu-lhe notoriedade em todo o espaço imperial; a invenção do escutismo, por ele próprio assinalada a partir do acampamento-teste do método, ocorrido na ilha de Brownsea (Baía de Poole, Dorset, Julho de 1907), conferiu-lhe reconhecimento a uma escala ainda maior. O seu “esquema” possuía grandes afinidades com os princípios da Educação Nova e pedagogias activas propugnados por Claparède, Freinet e Maria de Montessori. Num ambiente propício ao desenvolvimento de métodos educativos de promoção da saúde física, cívica e moral, Baden-Powell concebeu inicialmente o escutismo como um jogo de self-government para rapazes adolescentes. Apresentou-o num manual simples, intitulado Scouting for Boys, organizado em 28 palestras e dez capítulos (editado em fascículos, entre Janeiro e Maio de 1908, e a partir de então publicado na forma de livro).
Em que consiste, então, esse “esquema”? O escutismo assenta na fidelidade à Lei e Promessa, a sua fundação moral, e está estruturado com base em dois instrumentos essenciais: o sistema de patrulhas e o sistema de progresso. No referido manual, Baden-Powell prescrevia aos rapazes a formação de patrulhas (patrols), colectivos de cinco rapazes (em 1909 aumentou este número para seis ou sete) que elegiam entre si um guia (patrol leader); reunidas formariam grupos (troops), coordenadas por um adulto responsável, o chefe (scoutmaster ou scouter). Através de actividades organizadas no seio de cada patrulha e disputadas nas unidades ou entre unidades, cada escuteiro seria responsável pela própria aprendizagem e progresso (marcado por etapas estabelecidas no manual, com dificuldade crescente), testada em variadas provas de emulação com os seus pares. Uma vez superadas, estas eram assinaladas por insígnias apostas no uniforme, forma de identificação e nivelamento social do escuteiro. A aprendizagem de técnicas de sobrevivência, rastreio, orientação, pioneirismo, patriotismo e desporto, em meio selvagem (o da natureza) e civilizado (o da grande urbe), visava o aperfeiçoamento de cada rapaz rumo a um arquétipo de cavaleiro cristão moderno.
in LUSITÂNIA SACRA XVI
A INTRODUÇÃO DO ESCUTISMO EM PORTUGAL
de ANA CLÁUDIA S. D. VICENTE
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